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O Triunvirato do Carnaval: Brizola, Darcy e Niemeyer

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Sambódromo

Jota A. Botelho, Jornal GGN

Inaugurado em 1984, durante o mandato de Leonel Brizola, o conjunto arquitetônico de autoria do arquiteto Oscar Niemeyer, tinha por objetivo dar a cidade do Rio de Janeiro um local permanente para a os desfiles anuais das escolas de samba. Sua estrutura, construída com concreto pré-moldado, possui 700 metros e capacidade, atualmente, para aproximadamente 90.000 espectadores. Em sua passarela desfilam cerca 50.000 pessoas por noite. Pois é, nesse clima de folia o blog do PET Civil vem contar para você um pouquinho sobre a história da Passarela do Samba que é o palco do carnaval carioca, um desfile de sonhos e um dos maiores símbolos de festa e cultura nacional. Esse Sambódromo que é popularmente conhecido como Marquês de Sapucaí, por estar situado na rua de mesmo nome, tem como verdadeiro nome Passarela Darcy Ribeiro.

Brizola, Sambódromo
Brizola, Oscar e a maquete da Passarela Darcy Ribeiro
Até 1983 os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro eram realizados em instalações provisórias. Era preciso que todos os anos a estrutura para a festa fosse montada e após seu fim recolhida, o que gerava altos gastos com material e trabalhadores. Foi na intenção de economizar que nasceu a ideia de erguer o Sambódromo da Marquês de Sapucaí. Ele foi construído em tempo recorde (menos de 1 ano) no centro do Rio de Janeiro, junto a Praça Onze.

A estrutura inicial consistia de um lado, de seis blocos de arquibancadas separados 30 metros com o objetivo de criar as praças populares. Do outro, um grande bloco de camarotes que seguia até o fim do prédio da Brahma, até então existente.

Croqui do SambódromoCroqui do Sambódromo

Essa primeira versão do Sambódromo inaugurada em 1984, não seguia fielmente o projeto de Niemeyer. A construção deveria ser simétrica, com arquibancadas e camarotes semelhantes de ambos os lados, porém isso não ocorreu devido a antiga fábrica da cervejaria Brahma que ocupava o lugar e não podia ser demolida, pois era tombada pelo governo. Até 2011 o projeto permaneceu incompleto, mas logo após a revogação da lei urbanística que previa o tombamento da fábrica, o Sambódromo pode finalmente tomar a forma idealizada.

Sambódromo
A primeira face do Sambódromo carioca
O Sambódromo pode ser visitado durante o ano, em períodos fora do Carnaval. Durante o dia, o local geralmente fica aberto à visitação e pode-se aproveitar para visitar o Museu do Samba que fica no mesmo local. Outra boa pedida, é visitar o local durante os ensaios das Escolas de Samba, que são realizados à partir de Dezembro. No local também funcionam dois CIEPs de educação infantil, uma creche e uma Escola de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em 2016, a passarela sediará a competição de tiro com arco e a chegada da maratona dos jogos olímpicos, competições que exigiram algumas reforma ao longo de 2011, como a demolição de alguns camarotes. Com a reforma, a passarela passou a ser quase totalmente simétrica, com exceção da sua primeira arquibancada.

A construção do Sambódromo

Em seu primeiro mandato como governador do Rio de Janeiro (1983-1986) Leonel Brizola constrói o Sambódromo, hoje Passarela Darcy Ribeiro, com o objetivo de institucionalizar espaço próprio para grandes eventos, além do próprio carnaval, abrigando ainda no seu interior 260 salas de aula, atendendo cerca de 1000 alunos em período integral, e um Centro de Demonstração para treinamento e reciclagem do magistério estadual do RJ. A obra tinha por objetivo acabar com os gastos que anualmente eram efetuados na montagem e desmontagem da estrutura do carnaval. Este projeto do governo Brizola sofreu grande oposição por parte da Rede Globo, transmissora do Carnaval e que se recusou a transmitir o primeio ano de desfiles na avenida.

Brizola e as crianças do futuro CIEPs no local & Brizola e Darcy Ribeiro no desfile de inauguração do Sambódromo:



Depoimento de Oscar Niemeyer, arquiteto do Sambódromo (Passarela Darcy Ribeiro):
"Governador do Estado do Rio de Janeiro, Brizola me convocou novamente: queria construir os Cieps e o Sambódromo, o que, apesar do ambiente desfavorável em que vivíamos, juntamente com Darcy Ribeiro e José Carlos Sussekind, acabou concluindo com o maior êxito. Como foi difícil para ele essa tarefa. Contra a realização do Sambódromo tudo foi tentado. Diziam que o tempo era curto demais, que a época das chuvas chegava e até para um rio, que afirmavam correr por baixo das arquibancadas projetadas, apelavam. Nada o demoveu. Inflexível, Brizola tudo fez no curto prazo que tinha pela frente. O Sambódromo está construído - a grande festa popular que os nossos irmãos mais pobres lhe devem e de que os mais ricos, inclusive os que o criticavam, usufruem até hoje."

Depoimento de Fernando Brito, no seu Blog Tijolaço:
"Só quem tem de 50 anos para cima é que lembra do que vou contar. Anos a fio, a avenida Marquês de Sapucaí em setembro-outubro começava a receber as arquibancadas para o Carnaval. Eram feitas de tubos, se não me engano sempre com uma empresa chamada Mills. Depois, até abril, seguia-se o desmonte. Anos a fio, milhões e milhões gastos no monta-desmonta. Brizola tinha assumido o Governo do Rio de Janeiro em março de 1983. E, óbvio, a menor de suas preocupações era o carnaval de 1984. O Estado estava falido, e o governador biônico anterior tinha deixado uma bomba-relógio: a paridade dos aposentados, que até então recebiam muito menos do que os servidores da ativa. Paridade que começava – já adivinharam quando? – justamente no primeiro mês de governo do primeiro governador eleito pelo voto depois da ditadura… O baque e tanto na folha de pagamentos, resolvido com a criatividade possível: o pagamento, que era no início do mês passou para o final e os cargos comissionados – perto de 15 mil – a seres preenchidos, ficava retidos na burocracia real e na inventada, porque Brizola passou a só nomear quando o indicado tinha currículo completo, inclusive com foto 3×4, o que adiava, adiava…e economizava um ou dois salários. Não bastasse isso, o Banco do Estado tinha acabado – dias antes da posse de Brizola – de ser forçado a assumir o aval dos empréstimos – impagáveis – feitos para construir o Metrô do Rio de Janeiro. E como desgraça pouca é bobagem, ainda nos víamos às voltas com uma onda de saques, feita por provocadores e alastrada com as condições de extrema miséria do nosso povão. Não apenas aqui, mas também em São Paulo, onde botaram abaixo as grades do Palácio dos Bandeirantes. Agosto e setembro chegaram e os preparativos do carnaval seguinte estavam no seguinte impasse: ou reeditávamos a insana roubalheira de anos ou…ou nada,porque que diabos íamos fazer com um evento daquele porte? O máximo que sabíamos fazer era comício… Aí é que entraram a maluquice genial de Darcy Ribeiro, a ousadia insana de Brizola, a genialidade de Oscar Niemeyer e o low-profile de um engenheiro calculista chamado José Carlos Sussekind, que era quem tinha de fazer acontecer os delírios da trinca. Ele, uma vez, me contou que o “Doutor Oscar”, como ele e todos chamávamos o velho, projetou um hangar de doncreto, com um vão livre aparentemente inviável. “Mas Doutor Oscar, este vão é grande demais…” “Isso é problema seu , Sussekind”… Brizola, algumas vezes, descreveu aquilo: “Olha, Brito, se quatro anos atrás, no exílio, algum camarada me dissesse que eu iria ser governador do Rio de Janeiro, eu já despachava o índio como sonhador. Mas se me dissessem que eu ia ser governador do Rio de Janeiro e minha primeira grande obra ia ser uma passarela de carnaval, eu chamava alguém de lado e dizia: interna, porque este índio é muito louco…” Mas o índio não era tão louco, não é? A Passarela do Samba foi da maquete á realidade em exatos 110 dias. Sabe Deus como, porque o final do ano foi chuvoso e atrapalhou demais a fase das fundações, já complexa porque o terreno era pouco sólido e, ali em baixo, passava um rio. Mas como a maioria das estruturas era pré-moldada, fora dali, e apenas os suportes laterais e intermediários era concretados no local, a coisas de fato aconteceram. No dia a dia – ainda não havia essa preocupação com nepotismo – quem tocava a obra era o arquiteto João Otávio Brizola, turrão e marrento, sob a orientação – e de vez em quando os gentilíssimos trancos – de Sussekind, que apertava as empreiteiras onde lhes doía: nos pagamentos, que não saíam sem a obra andar. Mas o desafio de engenharia não era nada perto do desafio político. Brizola passou a ser tratado como um louco pela mídia, a obra não iria sair e era uma inutilidade.

O Globo

A charge aí em cima, publicada pelo O Globo, era apenas um pequeno retrato da sabotagem. Brizola era o Odorico Paraguassu e o Sambódromo o cemitério de Sucupira, jamais inaugurado por falta de mortos, como mostra a imagem da primeira página do jornal, guardada pelo querido amigo Ápio Gomes. A passarela ia cair. Quando não caiu, disseram que ninguém conseguiria ouvir o samba, por causa do eco. Que a pista ia afundar, porque havia – e há – um rio passando abaixo. E, pasmem, a Globo abriu mão dos direitos de transmissão. O Carnaval do Rio não ia passar na TV. Os ingressos encalharam, acredite se quiser. Brizola, então,convocou todos os secretários, presidentes de empresas públicas, assessores e maçanetes de todo o calibre para uma reunião, no auditório do Instituto de educação, na Tijuca. E transformou todos em vendedores de ingressos. Cada um tinha uma cota para vender, senão, rua. E a coisa andou. A recém criada TV Manchete assumiu a transmissão, seu maior sucesso de público. Às vésperas do Carnaval, perguntaram ao senhor Carlos Átila, então porta-voz do General João Figueiredo, o que ele achava da Passarela do Samba. Átila não respondeu, mas cantarolou uma velha marchinha de Emilinha Borba, dos anos 50: “tomara que chova, três dias sem parar”. Não choveu, a Passarela lotou e o povo desceu das arquibancadas em delírio, desfilando com a Mangueira o seu inesquecível “Yes, nós temos Braguinha” e o seu “é no balancê-balancê”… 30 anos depois, os Sambódromos se espalharam pelo país, um sucesso. (...) "

Nota do Jornal GGN: Trechos dos Blogs Brigada Socialista Autônoma e Tijolaço.

Nota do editor da Aldeia: Luis Nassif, editor do Jornal GGN de onde foi extraída a reportagem acima, recomenda ainda assistir aos quatro vídeos que seguem abaixo:
  • A Construção do Sambódromo do Rio de Janeiro, time lapse do ritmo das obras de reforma, visão em 3D da atual Passarela Darcy Ribeiro e o criador e sua obra - homenagem a Oscar Niemeyer.
  • Entrevista com Leonel Brizola no desfile de inauguração da Passarela do Samba.
  • Samba "Tranquilo com a vida", de autoria de Oscar Niemeyer, Edu Krieger e Caio Almeida.
  • Samba de autoria do arquiteto Oscar Niemeyer, de 1962, na voz de Jorge Aragão.







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